Reflexão sobre a dádiva

Casa de culto Papua e cerimônia de guerra.

Por João Fábio Braga

Dar, receber e retribuir: a tríplice da obrigação (reciprocidade das dádivas) que o antropólogo francês Marcel Mauss elaborou no Ensaio sobre a Dádiva de 1923.

A sua tese busca compreender a relação que muitas etnias dão ao sentido da dádiva em contrapartida a lógica da troca econômica ocidental, cujo o sistema capitalista orientou a troca como base da reciprocidade de interesses econômicos. Não quer dizer que essa orientação é de modo absoluto na sociedade ocidental moderna. Mauss demonstra que a forma da dádiva continua presente no ocidente, sobretudo quando afirma que o valor das coisas não podem ser superior ao valor da relação e do simbólico que constitui os vínculos e as alianças entre seres humanos.

Essa ideia surge quando Mauss investiga o sistema de trocas, observado nas sociedades étnicas da melanésia, conhecido como mana (substância ou força de aspecto sobrenatural e mágico que envolve vínculos de almas, ligado de maneira intransferível ao nome do doador, sobremodo o seu prestígio.

Essa transição é um terceiro entre os homens, ou seja, é a “coisa” doada, recebida e retribuída que carrega valor, que em si representa mistura de almas (doador e donatário) nas coisas ou misturam-se as coisas nas almas.

Nesse sentido, é pensar que o material e o espiritual se misturam. E a coisa dada sempre leva intrinsecamente algo do ser que o doou. Com efeito, longe do sentido utilitarista, a dimensão simbólica ganha a força necessária numa relação recíproca porque o donatário quer resguardar seu mana, seu prestígio, sua integridade espiritual, recebendo a integridade do outro na coisa, que possivelmente constitui o próprio nome, fama ou valor de “renome”, sendo obrigado a devolver de forma equivalente essa dádiva.

O que propõe Mauss através da dádiva, é que as manifestações de respeitos recíprocos do mana não são somente dessas etnias da Melanésia, Polinésia, africanas ou indígenas da América, mas que podem ser observadas universalmente e organizadas de modo particular em cada caso.

Pode ser que em muito casos, essa ideia que traz Marcel Mauss, não faça sentido algum ou total indiferença. Numa sociedade como a nossa imersa às telas não prestaria qualquer atenção a dimensão da dádiva nos círculos sociais hoje e outrora. A inclinação das relações sociais e da subjetividade à exclusiva dimensão monetária e ao narcisismo tecnológico produzem quase em sua totalidade simples trocas econômicas, que grosseiramente são descartáveis, supérfluas e fúteis.

Mas, pensando na ideia da reciprocidade das dádivas de Mauss, o que aconteceria se o donatário infringisse a regra?
🤔


Dádiva: dar e receber gratuitamente presente, oferta; doação.

Esse post foi publicado em Antropologia, Educação, Filosofia, Reflexão, Sociologia e marcado , , . Guardar link permanente.

Deixe comentário